Andressa SPINOSA (Universidade Federal do Ceará – UFC) – ORCID
andressaspinosa@alu.ufc.br
A voz média, tradicionalmente associada a construções de-transitivas que expressam mudanças de estado não provocadas (Givón, 1993; Langacker, 1991; Camacho, 2003), não apresenta marcas morfológicas explícitas nas línguas românicas. No português, uma de suas realizações mais frequentes ocorre em perífrases com “ficar”, sobretudo em combinações com particípio. Já o italiano dispõe de maior diversidade para codificar os mesmos valores, recorrendo a verbos como rimanere, essere, restare e a construções pronominais com si. Este estudo analisa construções com “ficar” no português e suas equivalentes em italiano, enfatizando a expressão de diátese e aspecto. Adota-se a perspectiva cognitivo-funcional (Langacker, 1991; Croft, 1994; Givón, 1995) e utiliza-se 126 ocorrências extraídas do subcorpus OpenSubtitles2018 (OPUS), composto por legendas bilíngues português–italiano. Os resultados indicam que, embora ambos os idiomas empreguem perífrases (39,7%) na expressão da diátese, o italiano apresenta maior diversidade tradutória, distribuindo-se entre construções predicativas (18,3%), pronominais (15,1%) e expressões idiomáticas. Quanto aos valores aspectuais do português, predomina a mudança de estado (41,5%), frequentemente traduzida por [essere/rimanere + particípio] ou verbos pronominais, favorecendo o apagamento do agente. As construções resultativas (31,7%) recorrem sobretudo a essere e rimanere, enquanto valores estativos e durativos, menos frequentes, realizam-se por stare, rimanere ou nominalizações fixas. Conclui-se que as assimetrias observadas evidenciam não apenas diferenças de codificação entre as línguas, mas também distintas formas de categorização de eventos e participantes. A diversidade tradutória reforça que, na equivalência entre línguas, não é apenas a estrutura morfossintática que orienta a escolha construcional, mas, sobretudo, os valores aspectuais e discursivos.
Palavras-chave: “Ficar”; diátese; aspecto.